segunda-feira, 29 de outubro de 2007

lágrimas com certeza...


Continuando a minha maratona de atualizações vamos falar de PIAF – Um hino ao amor. Quando teve a pré-estréia, meu chefe, que sabe que eu como filmes com farinha, me falou pra ir assistir. Isso já me deixou curiosa e foi uma decisão bem fácil ir ao cinema conhecer a história de Edith Piaf, por tudo que ela significa para o mundo. Eu nada sabia sobre a vida dela, só que era uma reconhecida cantora francesa, com uma puta voz, que cantava La vie em rose, L’Hymne à l’Amour e Non, je ne regrette rien. Música que por sinal todas as vezes que eu ouvia “Non! Rien de rien. Non! Je ne regrette rien. Ni le bien qu'on m'a fait...” eu me arrepiava dos pés a cabeça e não sabia muito bem de onde vinha toda a emoção que eu sentia. Ainda mais porque eu não falo nada de francês, ou seja, não sabia nem o que ela dizia. Agora, depois de conhecer a história de Edith e o que a canção significou na vida dela percebi que tinha toda a razão de me emocionar.
O filme conta de maneira muito interessante e envolvente a história dessa artista que ficou marcada nos anos 30, 40, 50... pra sempre. Dirigido por Olivier Dahan, ele aborda de forma não cronológica todos os aspectos da vida da cantora e usando mais de duas horas, que, honestamente, passam sem a gente nem sentir. Com uma vida muito complicada Edith se mostra uma verdadeira batalhadora, que aliando força e talento consegue alcançar o reconhecimento internacional. A vida dela envolve pobreza, abandono da mãe, parte da infância morando no bordel da avó, pai autoritário, morte de amores... várias, várias coisas ruins. É impressionante a vida que essa mulher teve. Além de todos os fatores externos, ainda tinha uma saúde muito frágil, talvez vinda da má alimentação e cuidados na infância. Fora as eventuais bebedeiras e vícios em morfina, que também contribuíram para sua morte aos 47 anos.
Enfim, o filme para mim é uma obra-prima. E vale muito, muito destacar a atuação da atriz francesa Marion Cotillard. Ela interpreta Edith em várias fases da vida adulta e o faz brilhantemente. É impressionante como ela consegue colocar toda a carga emocional da trajetória da atriz em seus gestos e palavras. Se Hollywood não fosse daquele jeito, eles teriam que abrir uma exceção ano que vem para dar o Oscar de melhor atriz à uma francesa. O filme é de derramar lágrimas. Fiquei chorando, sem palavras, vidrada na tela por uns bons minutos depois que ele terminou. Portanto, quem for assistir, sugiro que leve um bucado de lenço de papel, porque será necessário.
Foto Piaf: Maurice Seymour
Sobre o filme: http://www.edithpiaf.com.br/
Clipes de Edith Piaf:
- Non, je ne regrette rien : http://www.youtube.com/watch?v=i_QABS88nDc

- La vie em rose: http://www.youtube.com/watch?v=2-sUzR71wpQ

Site onde tem um monte de músicas dela, com letras e muitas fotos: http://www.bibi-piaf.com/

que belas Tapas!


O tempo sem atualizar é longo, mas vou retomando aos poucos os textos do que andei vendo e lendo nos últimos tempos. Vamos a sexta-feira, dia 12 de outubro, fui ao Cine Brasília assistir a Mostra de Cinema Espanhol. Sem saber nada sobre o filme, fui confiante de que veria algo legal. Acredito nos filmes espanhóis! Acho que é a minha paixão almodovariana. Lá chegando vi que o nome do filme era Tapas, uma comida típica da culinária espanhola. São pequenas porções de diversos pratos que servem como entrada ou aperitivo.*(saiba mais no fim do texto) Enfim, o filme, de José Corbacho e Juan Cruz, feito em 2005, é realmente como tapas, não aqueles que a gente leva e doem pra caramba, mas sim, como a comida, leve e saborosa. Ele conta cinco histórias de pessoas unidas pela rotina em um bairro de Barcelona, Hospitalet de Llobregat, o bairro no qual realmente cresceram os diretores do filme (inclusive vi em um desse sites de internet que volta e meia a mãe de José Corbacho descia de sua casa durante as filmagens para chamar o filho para almoçar).
Vamos ao básico das personagens: Dona Conchi é uma senhora idosa lidando com o câncer terminal do marido Mariano, que por sinal, está meio confuso com essa história de morrer. Opo e César trabalham no supermercado e são dois jovens cheios de energia, principalmente sexual. Raquel é a dona da mercearia, que depois de abandonada pelo marido, começa a namorar pela internet com um cara em Buenos Aires. Manolo é um bicho bruto pra caramba que é dono do bar e acaba sendo largado pela mulher, claro, por ser um cara “gentil” demais. Mao, é um cozinheiro de Hong-kong, muito do comédia que vai trabalhar com Manolo depois do abandono da mulher. E assim, as histórias se encontram e desencontram ao longo da trama que trata de temas pesados de uma maneira bem sutil. Ah, vale dizer que ele levou o prêmio de melhor roteiro no Festival de Montreal, realizado no Canadá.
O filme é como uma crônica, dessas bem boas que a gente não consegue parar de ler enquanto não acaba. Sabe aquela sensação que a gente tem quando “se joga” em um sofazão daqueles bem grandes e fofos e não quer sair dali nunca mais? Pois é, foi isso que eu senti ao assistir o filme. Não sei se é porque eu de fato estava sentada na cadeira maravilhosa do Cine Brasília, com toda aquela imensidão, o espaço para bunda, pras pernas, sem nenhuma cabeça na frente... Viva o Cine Brasília! Eu amo aquele cinema. Uma pena que os outros como ele que existiam na cidade tenham virado igrejas. É isso. Não sei se posso dizer “assistam” porque não sei se o filme é fácil de encontrar. Mas se souberem onde arrumar, vale a pena. Talvez tenha em locadoras “cults”, não sei.

*Tapas - O conceito das ‘tapas’ antes da refeição é uma das mais importantes contribuições espanholas para o mundo da gastronomia. A ‘tapa’ é uma peça de comida pequena e leve que os espanhóis consomem antes do almoço ou do jantar, sempre com um copo de vinho ou uma cerveja. O costume das ‘tapas’ permite a ingestão de diversos copos de vinho ou cervejas antes das refeições, escondendo o apetite (tapa el hambre - tapa a fome). A ‘tapa’ pode ser apresentada de diversos modos: como um mini-prato de uma receita tradicional, como um canapé, etc... (fonte: http://www.spain-grancanaria.com/p/spanish-food.html)
Saiba mais sobre tapas e ainda confira algumas receitas no link:
http://www.guiadasemana.com.br/noticias.asp?ID=2&cd_news=2285

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

mundo dos mortos


— Boa tarde, vocês têm um livro chamado Pedro Páramo do autor Juan Rulfo?
— Perae, vou ver. Fulano, tem algum livro do Pedro Páramo?
— Não moço, o nome do livro é Pedro Páramo, o autor é Juan Rulfo.
— Ah tá. Vou ver no sistema. Hummm, to vendo aqui mesmo Pedro Parâmo e o Planalto em chamas...
— Tem?
— Não.

E assim foi a minha romaria pela 26ª Feira do Livro de Brasília atrás do livro que o Thiaguinho havia mandado os olivroestasobreamesistas lerem. Fui a todas as barracas da Feira, menos nas que vendiam publicações para estudantes de concurso público e naquelas de literatura evangélica. Depois disso parti para ajuda matrimonial:
— ‘more, pega o Pedro Páramo na Biblioteca do Ceub pra mim?
— No sistema diz que tem, mas não achei nas prateleiras. Tem uns 200 exemplares em espanhol, serve?
— Não. Pega na Biblioteca da UnB então?
— Na UnB só tem um exemplar em português e está emprestado. Tem em espanhol. Serve?
— Não.

Quando a esperança já havia acabado e o desespero tomado conta, uma das 550 encomendas que eu tinha feito nas livrarias da cidade deu certo. A Livraria da Rodoviária me ligou para ir buscá-lo e fui como se fosse um prêmio. Saí da loja abraçada com o meu suado exemplar. Já nas primeiras páginas eu pirei com o livro. Tive que pegar um lápis e um papel para montar um esquema para ver se entendia tudo direitinho.
Ele começa com o narrador, Juan Preciado, indo à cidade de Comala, estado de Guadalajara, México. A viagem era por causa de uma promessa feita à mãe (Dona Doloritas) de que iria conhecer o pai — Pedro Páramo — depois que ela morresse. Segundo ela “... exija o que é nosso. O que tinha a obrigação de me dar e nunca me deu... O esquecimento em que nos manteve, meu filho, cobre caro.”
No caminho, Juan encontra o arrieiro Abúndio e conversando descobre que Pedro Páramo também é pai de Abúndio. Quando ele pergunta como é o pai, a definição vem seca: “um rancor vivo”. Depois de mais umas linhas de prosa, Juan fica sabendo que o pai está morto há anos. A partir desse momento, vários personagens começam a aparecer na história, cada um contando sua história e de repente eu tomava o choque — eles estavam mortos. Daí um pouco estava me perguntando se tinha alguém vivo no livro.
A resposta era clara — NÃO. Comala era uma cidade morta. Uma espécie de purgatório onde os cidadãos estavam pagando seus pecados. A cidade era tão quente, tão quente, que o próprio Abúndio comenta com o Juan: “Aquilo está sobre as brasas da terra, na própria boca do inferno. E posso até te dizer que muitos dos que morrem por lá, ao chegarem ao inferno, voltam pra buscar o cobertor.”
O livro é um exercício de concentração brilhante, porque sem separação por capítulos, ele se alterna na história de Juan Preciado em Comala e na vida de Pedro Páramo, desde a infância. Lá pela metade existe uma polêmica - descobre-se que o narrador, Juan Preciado também está morto e conta a história de dentro de uma cova onde está enterrado junto com uma mulher, considerada a louca da cidade, Dorotea. Para mim é isso que acontece. Ele está morto desde o começo e na metade do livro é quando ele se toca disso. Mas alguns defendem que ele foi para Comala, não suportou o clima de alma penada da cidade e morreu de medo lá mesmo. Eu acredito que a alma dele está lá para pagar a penação da mãe dele. Era dela o destino de passar a eternidade vagando como mais uma das almas penadas da cidade que abandonou na juventude. A interpretação fica em aberto para cada leitor decidir.
Enfim, em determinado momento eu parei de ler o livro porque não queria que ele acabasse. Tentei aproveitar o máximo possível das poucas 103 páginas. Fui absorvendo cada palavra com todo cuidado. Senti as sensações mais diferentes lendo a história de cada um dos personagens. Culpa, nojo, calor, fedor, até pesadelos tive com o livro.
A
conclusão disso tudo é: obrigada Thiaguinho por me fazer ler esse livro. Juan Rulfo é um autor super reconhecido e depois de ler Pedro Páramo, dou toda razão ao mundo por reconhecê-lo como um grande escritor. Ele simplesmente influenciou um dos melhores escritores do mundo — Gabriel García Márquez. E, de fato, comparando a literatura dos dois, Gabo tem muito de Rulfo. Ele conta que havia chegado ao México em 1961 e não sabia da existência de Rulfo. Um dia o também colombiano Álvaro Mutis lhe dá um livro e lhe ordena que leia, “para aprender”. Era Pedro Páramo. Não conseguiu dormir enquanto não terminou de ler pela segunda vez o livro. “Nunca, desde a noite tremenda em que li Metamorfose, de Kafka, numa pensão de estudantes lúgubre de Bogotá — quase dez anos atrás —”, relata García Márquez, “tinha sofrido comoção semelhante”. Passou o resto do ano sem ler outro autor, porque qualquer outro lhe parecia menor. (trecho retirado do ensaio de Paulo Paniago, meu próprio marido, baseado no texto Breves nostalgias sobre Juan Rulfo, de Gabriel García Márquez).
Agora é esperar o filme que está por vir. A produtora mexicana Canana está adaptando a história para o cinema com a direção do espanhol Mateo Gil e com o ator Gael García Bernal no papel de Pedro Páramo. Não sei como eles vão conseguir transformar em imagens tudo o que eu li, mas eu estou muito curiosa.
Foto de Juan Rulfo: Lola Álvarez Bravo